?️ Calor recorde na Europa, EUA e China mostra aumento de efeitos da mudança climática
A forte onda de calor continua gerando focos de incêndio e alertas máximos em diversos países da Europa. Nesta semana, Reino Unido, Espanha, Dinamarca e Alemanha chegaram a temperaturas altas jamais registradas.
O Reino Unido excedeu 40ºC pela primeira vez na história, na terça-feira (19). Um incêndio afetou uma área residencial em Londres com um alerta de nível médio emitido pela Brigada de Incêndio de Londres. Já na quarta (20), a Escócia atingiu 35,1ºC após a noite mais quente de sua história, com 21,3ºC. No mesmo dia, a Dinamarca registrou 35,9ºC, superando os 35,3ºC de 1941. Por sua vez, a Alemanha bateu seu recorde com 40,1ºC no norte do país; e a Espanha registrou 40,7ºC em Madri.
Milhares de pessoas foram evacuadas devido à rápida expansão dos incêndios, que se alastram em uma combinação de ventos quentes e escassez de chuvas, cenário que deve afetar vegetações e cultivos nos próximos meses. A Espanha tem o quadro mais dramático, com 190 mil hectares de queimadas neste ano. A Itália sofreu uma série de incêndios de norte a sul, com uma seca que não se via há sete décadas, e a Grécia teve quatro cidades evacuadas devido aos incêndios.
Escolas suspenderam suas atividades e um sindicato no Reino Unido exigiu o cumprimento da temperatura máxima legal para trabalhar.
Na segunda-feira (18), a França marcou 42ºC de temperatura. V. N., morador de Paris e habituado aos verões calorosos na cidade francesa, foi surpreendido pela extensão dos dias mais quentes, que podem chegar a 40ºC. “Normalmente, esse calor extremo dura uma semana, mas esse ano está demorando mais a passar”, relata. “O calor é tão intenso que, em um fim de semana, o parque aquático Aquaboulevard foi tomado de assalto por milhares de pessoas.”
Cenário frequente
Temperaturas mais altas vêm sendo registradas ao longo de décadas, e não apenas na Europa. As ondas de calor aparecem, assim, como um dos efeitos do aumento de temperatura média do planeta que, desde a era pré-industrial, já subiu 1,1ºC. O resultado é o que vemos, e que deve ser aprofundado nos próximos anos.
Os impactos diferem em cada região: assim como o calor extremo, também são registradas ondas polares, seca, inundações, furacões e incêndios.
Para evitar uma catástrofe ainda maior, o aumento médio da Terra não deveria ultrapassar 1,5ºC conforme firmado pelos países no Acordo de Paris. Mas, por enquanto, o rumo tomado indica o pior panorama.
“Pode ser que uma onda de calor venha e não seja recorde, mas sim tenha a ver com a mudança climática”, pontua Inti Bonomo, diretor da área de Gestão Ambiental da Universidade Argentina Da Empresa (UADE). “O que as evidências mostram é que esses eventos que aconteciam a cada cem anos, que nos contavam nossos avós de uma onda de calor dos anos 30 e era recorde, vai acontecer cada vez mais.”
Uma pesquisa recente publicada na revista científica Nature aponta que as ondas de calor na Europa serão cada vez mais frequentes. As tendências, diz o estudo, são de três a quatro vezes mais rápidas em comparação com as médias do norte nos últimos 42 anos.
Devido ao calor extremo, foram registradas pelo menos 1.700 mortes na Espanha e em Portugal.
A Organização Meteorológica Mundial (OMM) acredita que a onda de calor já atingiu o seu pico na Europa. Apesar da trégua nesta quinta-feira (21), com uma baixa de temperatura na França e no Reino Unido, os incêndios seguem afetando países como Espanha, Itália e Grécia. No entanto, cientistas apontam para a maior frequência em menor tempo de eventos como as ondas de calor, efeito da mudança climática provocada pela atividade humana.
“A ciência foi capaz de identificar que eventos extremos de muitos tipos estão ocorrendo com mais frequência e intensidade”, afirma a cientista colombiana Paola Arias Gómez, integrante da equipe do relatório do IPCC sobre mudança climática da ONU. “É surpreendente que o calor extremo esteja aumentando em praticamente todas as regiões do planeta. Particularmente, as ondas de calor vêm se manifestando mais rápido do que inicialmente era previsto.”
Ondas de calor também afetam o outro lado do oceano Atlântico. Nos Estados Unidos, a sensação térmica de 40ºC configura um verão atípico para estados como Oklahoma, Texas e Dakota do Sul, e o Serviço Nacional do Clima prevê a expansão do calor para o sudeste do país neste fim de semana.
A China também enfrenta uma forte onda de calor. Desde a semana passada, 84 cidades emitiram alerta vermelho pelo calor extremo, que afeta mais da metade do país.
“Isso se deve às mudanças geradas pelas emissões de gases de efeito estufa e pelas mudanças do uso do solo, que afetam a composição química da atmosfera”, afirma Gómez. “A ciência já avançou a ponto de poder afirmar que a onda de calor que acometeu a Índia há algumas semanas, por exemplo, não seria possível sem a intervenção da atividade humana.”
Transição energética
Em conferência de imprensa nesta semana, a diretora do departamento de saúde pública e do ambiente da Organização Mundial da Saúde (OMS), Maria Neira, disse que a situação na Europa é um chamado sobre os custos da mudança climática.
“Estamos alertando há muito tempo que a mudança climática afeta profundamente a saúde humana e, para evitar isso, devemos alcançar a meta de emissões zero de gás carbônico e acelerar a transição energética para fontes de energia renováveis”, disse.
Os países agora afetados de maneira mais severa, com implicações sociais e ambientais, são os responsáveis pelos índices mais altos de emissão de gases do efeito estufa, principal causa do aumento da temperatura média do planeta.
“A classe econômica e política, ao avaliar se devem atuar contra a mudança climática, costumam dizer que não há dinheiro”, aponta Bonomo. “Mas já estamos vendo tudo o que perdemos, em termos econômicos, por falta de atividade, produtividade, educação, por causa da mudança climática. Fazer algo é caro, mas não fazer é muito mais caro, e isso deve estar na consciência dos tomadores de decisões”, destaca.
Diante das tragédias sociais e ambientais intensificadas nos últimos anos pela mudança climática, a solução deve ser profunda, como destaca Paola Gómez. Implicaria uma mudança de sistema, de mentalidade, e guiada pela perspectiva da justiça climática, que deve estar no centro das políticas para frear as emissões e tornar viável a meta firmada no Acordo de Paris.
“O ponto central da ação climática não está apenas em pensar tecnologias ou formas de reduzir emissões, mas pensar em como resolver as desigualdades, porque é algo estrutural”, aponta Gómez. “É um assunto fundamental. Não é o mesmo uma onda de calor na Índia, que afeta um grande número de pessoas que não têm suas necessidades básicas atendidas, do que na França, na Holanda ou no Reino Unido. A possibilidade de adaptação é muito maior, e o impacto é diferente.”
? © Pxhere
Rádio Centro Cajazeiras via Fernanda Paixão do Brasil de Fato