O presidente Jair Bolsonaro voltou a demonstrar irritação com o vice Hamilton Mourão. Numa conversa no início da tarde desta sexta-feira, 13, ele disse a auxiliares que o general da reserva não “ajuda” o governo. Desta vez, o motivo da queixa foi uma entrevista em que Mourão avaliou que a vitória do democrata Joe Biden nas eleições americanas é cada vez mais “irreversível”. Bolsonaro enfrenta pressão dentro e fora do Palácio do Planalto para admitir a derrota do aliado Donald Trump.

Nos últimos dias, ele deixou explícita sua divergência com o vice, por causa da divulgação de documentos do Conselho Nacional da Amazônia. O órgão presidido por Mourão planejava desapropriar terras de desmatadores. Depois de Bolsonaro classificar a ideia como “delírio”, os dois conversaram longamente ontem, quinta-feira, e restabeleceram as pontes, segundo informaram pessoas próximas. A trégua na relação de permanentes atritos, porém, não durou 24 horas. A entrevista de Mourão na manhã de hoje à Rádio Gaúcha, de Porto Alegre, expôs novamente o mal-estar.

Na conversa de quinta-feira, Bolsonaro e seu vice tinham posto na mesa uma série de questões que tinham afastado os dois. Uma delas era uma suposta negociação entre Mourão com o apresentador de TV Luciano Huck e o ex-ministro da Justiça Sergio Moro para uma aliança em 2022. A especulação tornou-se mais intensa no Planalto após o ex-juiz da Lava Jato citar, numa entrevista ao jornal O Globo, o nome do vice como uma das lideranças do campo moderado. A relação entre Moro e o general sempre foi de cordialidade dentro do governo.

Por sua vez, Mourão ressaltou sua lealdade ao presidente. O general disse que não estava de olho em 2022 e não fazia tratativas com os adversários do Planalto. Ainda no encontro, Bolsonaro e o vice chegaram a concordar que há um movimento “diuturno” para “explodir” a relação entre eles.

Ressalvaram, no entanto, que precisavam conversar, sempre, para acertar os ponteiros. Falaram das muitas “intrigas palacianas” que atingiam a parceria. Um ponto de entendimento entre Bolsonaro e o vice é o interesse do chamado Gabinete do Ódio, ala ideológica do Planalto, em afastar um do outro.

Devido o longo tempo da conversa, o presidente demonstrou surpresa com a decisão do vice de expor, horas depois, uma visão divergente sobre o quadro político americano – Bolsonaro não que a eleição nos Estados Unidos se encerrou, numa fidelidade ao aliado Donald Trump. De nada adiantou Mourão ressaltar, na entrevista, que falava na condição de “indivíduo” e não representante do governo.

No Palácio do Planalto, há um entendimento que o presidente só espera o resultado oficial para reconhecer a vitória democrata.

Neste momento, Bolsonaro não pretende procurar Mourão para restabelecer a ponte que tinha acabado de ser reconstruída e ainda estava com o “cimento molhado”, nas palavras de auxiliares diretos. Em conversas, o presidente tem dito que não pretende repetir a chapa vitoriosa de 2018. Mourão, por outro lado, afirma que está focado na sua missão de vice-presidente e chegou a admitir que pode concorrer a uma vaga no Senado nas próximas eleições.

Bolsonaro conhece o temperamento de Mourão e sabe que o seu vice não evitará emitir opiniões pessoais, muitas vezes polêmicas, sobre os mais diferentes assuntos. O presidente também tem consciência que o general saiu em defesa dele e rebateu críticas a suas falas e seus discursos. Por isso, a aposta do Planalto é que essa relação será de amor e ódio até o fim do governo.

Com períodos de moderação e de explosões, o presidente já deixou claro que não abandona as redes sociais e é sensível à ala ideológica. Integrantes do grupo com postos no Planalto e fora dele não se cansam de encaminhar, desde cedo, links de reportagens e comentários que alimentam a irritação dele.

Foi o que ocorreu na quarta-feira. Um Bolsonaro explosivo disse, numa cerimônia sobre a retomada do turismo, que o Brasil é um país de “maricas”, referindo-se às pessoas preocupadas com a covid-19. O destempero verbal continuou com uma ameaça a Joe Biden. Para o drama dos auxiliares, ele afirmou que, depois que acabar a “saliva”, tem que ter “pólvora”.

Via Estadão Conteúdo

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