|💦🏞️ Superexploração provoca diminuição na vazão de mais da metade dos rios brasileiros
Por Yasmin Teixeira, do Jornal da USP ✍️
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📸 © Ilustrativa/Marcio Pinheiro/MIDR
A percolação trata-se de um movimento descendente da água que se infiltra através das camadas de solo e atinge as águas subterrâneas ou aquíferos. O fenômeno é um movimento natural, entretanto, vem sendo significativamente intensificado pela ação humana, como mostrado pelo artigo Widespread Potential for Streamflow Leakage Across Brazil, produzido por pesquisadores da USP e internacionais.
Segundo o artigo, mais da metade dos rios brasileiros apresentam risco de redução de fluxo devido à percolação. Para esse resultado, os pesquisadores analisaram 17.972 poços ao redor do território nacional e, destes, 55,4% apresentaram níveis de água abaixo da superfície dos rios mais próximos.
De acordo com José Uchôa, primeiro autor da pesquisa e doutorando no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos da USP, esse gradiente de diferença indica uma significativa perda d’água. “Com essa diferença de nível você pode criar esse gradiente, ou seja, que o rio vai ceder água para o aquífero. E, acontecendo isso a longo prazo, você pode diminuir a vazão desse rio.”
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Intensificadores
A percolação é influenciada por fatores da natureza como clima e formação geológica, que são responsáveis pelo delineamento dos cursos de água. Entre as principais ações humanas que podem acentuar o processo de transferência da água, destaca-se o seu mau uso intensivo e a perfuração, a maioria ilegal, exacerbada de poços.
Mais presentes principalmente em regiões agrícolas voltadas para a irrigação, os poços e o mau planejamento de utilização da água prejudicam a capacidade de escoamento, além de retirar grandes quantidade dos rios, diminuindo seus níveis, como explicado por Silvio Ferraz, professor do Departamento de Ciências Florestais da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP.
“É o mau uso da água na superfície. Se eu não tenho processos que permitam a infiltração de água no solo, se há muito escoamento superficial nessa água, então não entrando no solo, não recarrega o aquífero, ou seja, não tem entrada de água. Se eu tenho um uso muito intensivo dessa água também não sobra água para o aquífero.
E, mais assim, diretamente, a perfuração de poços, que retira a água diretamente do aquífero, faz com que o seu nível desça. Então, se não entra água e a gente usa a água desse aquífero, ele tende a diminuir de nível”, detalha o professor.
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Consequências
Além de problemas ambientais, como afundamento do solo e escassez de água para ecossistemas e fauna, a redução do nível do leito dos rios pode interferir no abastecimento urbano ao comprometer o volume de água de rios que abastecem as cidades, causando longos períodos de estiagem, como explicado por Paulo Tarso, segundo autor do artigo e professor no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos da USP.
“Se uma cidade ou se pessoas necessitam de usar essa água do rio para abastecimento humano, desinfecção de animais, produção de alimentos, o que seja, vai diminuir a quantidade de água. E se a gente passa, por exemplo, por momentos de estiagens, momentos secos, essa água disponível vai ficar ainda mais comprometida, porque é a vazão de base alimentada pelos aquíferos. Então a vazão de base do rio fica comprometida.”
Controle e vigilância
Para os pesquisadores do estudo, ações como a vigilância sob a perfuração de poços e o melhor planejamento sobre o aproveitamento da água são algumas das alternativas que podem ajudar a restringir a expansão da percolação que, segundo Uchôa, devem estar conjuntas à gestão integrada das águas superficiais e subterrâneas.
Na visão de Uchoa, os órgãos de vigilância deveriam comunicar-se de maneira mais efetiva, evitando possíveis acidentes nos quais águas de um mesmo aquífero e rio sejam drenadas para fins agrícolas, o que intensifica a diminuição de sua vazão. “Esses órgãos de gestão deveriam conversar entre si, além de haver uma verificação toda vez. Se eu vou mexer em um compartimento, no rio ou no aquífero, qual é a influência dessa minha operação? Se eu vou tirar água, colocar água, no outro compartimento, não? (…) enxergar a água de forma integrada na gestão. Toda vez que alguém outorgar é necessário considerar a água superficial e subterrânea de forma única, tem um ponto que a gente pode chamar de planejamento.”
|📸 © Marcello Casal Jr./Agência Brasil
Rádio Centro Cajazeiras