Há 14 anos o Brasil lidera o ranking dos países que mais matam pessoas trans
📸 © Daniel Reche via Pixabay

Por Eliane Gonçalves, da Agência Brasil 

A importância de ter um nome, a importância de ter uma vida. O nome define a sua vida. Eu sou o Neon Cunha, uma mulher negra, ameríndia e transgênero, nessa ordem de importância.

Neon aprendeu bem jovem que precisaria lidar com racismo, a discriminação, a violência de gênero e a transfobia. Fazendo parte de que tem uma expectativa média de vida de 35 anos, Neon também aprendeu com a morte.

E uma coisa que me marcou muito ao longo da vida foi que todas as minhas amigas foram enterradas de uma forma que eu nunca reconheci. Se eu tivesse que procurar hoje essas pessoas em uma lápide, jamais eu vou ter acesso.

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E foi assim que ela pediu pra morrer. Neon entrou com um processo na Organização dos Estados Americanos (OEA) em 2014 para ter o direito de ser reconhecida como mulher. Foi ao limite. Pediu que, caso sua existência expressa no gênero e no nome não fosse reconhecida, queria autorização para uma morte assistida.

Aí eu dei conta que eu não tinha nada mesmo. Eu tinha sido expulsa de casa em 1992. Tinha acontecido tudo que tinha que acontecer com uma pessoa trans. E nós perdemos o quê? O que não vai ter é esse nome na lápide e aí eu abri o processo.

Neon venceu, retificou o nome e o sexo sem precisar fazer cirurgias. A decisão do STF é de 2018 e abriu caminho para que homens e mulheres trans tivessem acesso ao mesmo direito.

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Ter um nome é um direito tão básico que se quer há uma referência a isso na Declaração Universal dos Direitos Humanos, mas o direito de existir e viver com dignidade já aparece de cara no primeiro artigo.

Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com o espírito Fraternidade.

A população LGBTQIA+ tem conquistado avanços na sociedade brasileira: o direito a união entre pessoas do mesmo sexo, o direito a retificação do sexo, o direito de adoção de filhos.

Para Marcos Tolentino, historiador e ativista, a Constituição de 1988 abriu o caminho

A Constituição de 88 eu acho que a inspiração dela é em relação a declaração universal de direitos humanos é justamente buscar essa ideia de uma cidadania que é de todas as pessoas né? E nisso prevê algumas especificidades direito de gênero, de direito de povos indígenas, de direito de pessoas negras, por entender que são grupos, são pessoas, que já vinham desse processo de exclusão de direitos.

Mas ainda há muito que avançar.

Há 14 anos o Brasil lidera o ranking dos países que mais matam pessoas trans. Em 2022, foram 131 pessoas assassinadas. 20 tiraram a própria vida em razão da discriminação e do preconceito. Os números são da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA).

Toda vez que eu acesso esse lugar do direito humano, eu fico perguntando: quando ele vai ser pleno pra nós? Essa plenitude é justamente, eu vou lutar por políticas públicas, vou, vou lutar enquanto ativista, vou, vou disputar a política institucional? Vou… mas vai ser plena.

Toda vez que eu penso nisso, de direito à humanidade plena, eu espero que a humanidade entenda que trans é um código de liberdade.

|📸 © Cristine Rochol/PMPA

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