Brasil, um país com pouca infraestrutura para ciclistas e aumento de motorização no transporte
📸 © Rovena Rosa/Agência Brasil

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou dados do Censo 2022 sobre as características urbanísticas do entorno dos domicílios em abril. A pesquisa analisou dez quesitos relacionados à infraestrutura urbana brasileira. Dentre os aspectos relatados, a situação de vias próprias para bicicletas nos arredores das casas é preocupante. Segundo a pesquisa, apenas 1,9% dos entrevistados relatou haver equipamento urbanístico especializado para ciclistas em volta de suas casas. O dado se relaciona ainda com outra questão relevante: as mortes no trânsito. Apenas no Estado de São Paulo, em 2024, 367 ciclistas morreram em decorrência de acidentes, número maior quando comparado aos 329 óbitos em 2023, segundo o Detran.

A escassez de infraestrutura

Mateus Humberto, professor do Departamento de Engenharia de Transportes da Escola Politécnica da USP, relata a respeito da falta de estrutura própria para ciclistas nos municípios brasileiros. “Nós vemos um país com pouquíssima infraestrutura dedicada para ciclistas, acompanhado de um aumento de uma motorização no transporte do Brasil, que é puxado não só por automóveis e motocicletas particulares em quase todas as regiões, mas também o aumento do transporte de cargas, por meio de caminhões, motocicletas, o que faz com que a gente tenha um sistema de transportes que é muito mais letal.”

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A questão não pode ser justificada apenas pela falta de estrutura especializada para bicicletas. A problemática, também, é resultado de uma cultura de não compartilhamento das vias de trânsito, os chamados shared spaces. Em alguns países ao redor do globo, esse mecanismo de repartição do espaço nas ruas e estradas é incentivado. Além disso, políticas de limitação de automóveis motorizados também têm crescido no mundo. No Japão, segundo o professor, os moradores não podem comprar um automóvel sem garantir que se tenha um espaço de estacionamento dentro do seu lote. Enquanto isso, no Brasil, há o fomento do transporte motorizado individual, o que não só contribui para os altos índices de acidentes no trânsito, como também afeta diretamente na poluição do meio ambiente.

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Outra pauta muito debatida quando falamos sobre acidentes nas ruas e estradas é a educação no trânsito. Tanto ciclistas quanto motoristas devem ser educados corretamente sobre as normas de trânsito, tal como devem ser punidos caso não as sigam. Contudo, essa não deve ser tratada como a única solução. “A minha visão é que é muito inócua a eficácia da educação, tanto para motoristas quanto para ciclistas, se a gente não tem as condições básicas de circulação e de infraestrutura. A meu ver, esse enfoque em educação muitas vezes é tratado como um escape para não se discutir elementos que são mais estruturantes para resolver ou buscar mitigar essa situação preocupante da segurança no trânsito”, defende Mateus Humberto.

Investimento público

Para a resolução da questão é imprescindível o investimento estatal em transporte público, segundo o docente. Entretanto, há uma contradição nos atuais governos ao redor do País. Ao mesmo tempo que prometem priorizar questões de transporte público, colocam na maioria das vezes ciclistas e pedestres como últimas prioridades. “Nós vemos uma meta do governo de 10 milhões de metros quadrados de asfalto para São Paulo, nos próximos quatro anos, vê-se uma meta de 500 mil metros quadrados de calçadas construídas pelo poder público. Isso é mais um exemplo dessa pirâmide de prioridades em torno dos automóveis, seguida pelas motocicletas, pelo transporte de cargas”, afirma o professor.

Por Breno Marino e Paulo Capuzzo, do Jornal da USP

|📸 © Cecília Bastos/USP Imagens

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