Decisões judiciais de interrupção de gravidez precisam garantir direitos humanos das mulheres 📸 © Rodrigo Nunes

Por Rose Talamone, do Jornal da USP

A advogada Vanessa Ramos da Silva, doutoranda em Direito na Universidade do Vale do Rio dos Sinos, no Rio Grande do Sul, falou com a reportagem sobre a decisão proferida em 2017 em um processo de pedido de autorização judicial para interrupção da gravidez de feto com malformações congênitas, chamada complexo de Oeis.  

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Vanessa conta que, após a decisão de 2012 na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 54, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que é inconstitucional a interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo constitui aborto, os pesquisadores encontraram elementos interessantes para discutir problemas frequentes sobre o tema no sistema de justiça brasileiro. O primeiro deles é a ausência de uma legislação doméstica que consiga garantir uma segurança jurídica para esses pedidos de interrupção de gravidez, decorrentes de malformação fetal e a ausência de uma perspectiva de gênero no julgamento desses casos que envolvem os direitos humanos das mulheres. 

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Segundo Vanessa, as pesquisadoras acreditavam que, depois do julgamento da ADPF 54 pelo STF, existiria uma certa tendência a acomodar casos semelhantes, “mas, a partir das nossas leituras e também da minha pesquisa de mestrado, concluímos que casos de pedido para interrupção de gravidez não só continuavam chegando no sistema de justiça, como também existem inúmeras decisões contrárias a esse precedente do STF”. 

Violação de direitos humanos

A partir de metodologia feminista, as pesquisadoras propuseram uma reflexão para compreender como diferentes matrizes de dominação se expressam nessas estruturas e acabam por produzir diferentes formas e sistemáticas de violação aos direitos humanos das mulheres pelo sistema de justiça. A partir dessa reflexão, para a reescrita, as pesquisadoras utilizaram um Protocolo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para julgamento com perspectiva de gênero, um guia para que os julgamentos não levem a uma repetição de estereótipos e a não perpetuação das diferenças. 

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Para a pesquisadora, os resultados, a partir do uso de teorias e métodos feministas, apresenta um potencial de superar os limites de uma simples aplicação do que já tem preestabelecido nos códigos, pois leva em consideração outras questões, principalmente aquelas relativas à construção social da maternidade, aos direitos que estão vinculados a essa construção social.

A desconsideração do aspecto que é volitivo dentro da maternidade, diz Vanessa, constitui, por si só, uma violação dos direitos, mas, ao incorporar uma perspectiva feminista, que vai levar em consideração esses desafios, existe, de fato, justiça reprodutiva. “Aí está a diferença entre a sentença original e a reescrita. Na primeira, temos a repetição de vários estereótipos de gênero que foram utilizados como fundamento para indeferir o pedido. Enquanto na reescrita, a partir de uma perspectiva de gênero e utilizando também o protocolo como parâmetro, foi deferido o pedido, como uma medida de efetivação dos direitos humanos das mulheres, em especial os direitos reprodutivos.”

📸 © Tima Miroshnichenko

Rádio Centro Cajazeiras

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